Classificar obras, autores e diferentes correntes de todo um campo de conhecimento, como fez Mintzberg (2010) com a administração estratégica, é uma tarefa que exige extensa pesquisa e vivência. Não temos condições de propor algo parecido com a bibliografia de planejamento em marketing e comunicação, mas é possível encontrar semelhanças em algumas dessas obras com os diferentes pensamentos estratégicos.
Em Marketing para o Século XXI, Philip Kotler (1999, p. 206) adota uma abordagem prescritiva: “uma empresa precisa preparar planos de marketing para cada uma das principais áreas de ação de marketing, o que implica seis tipos de planos”. Os planos seriam de marketing de marca, por categoria de produto, para novos produtos, por segmento de mercado, por mercado geográfico e por cliente. Para cada um dos seis tipos, o autor sugere que sejam feitos dois planos, um de longo prazo, que pode ser de “20 anos para serviços de utilidade pública ou três anos para setores de alta tecnologia”, e outro plano anual.
Os planos devem conter no mínimo uma análise situacional (que inclui como componente a análise SWOT), objetivos e metas de marketing, estratégia de marketing, plano de ação de marketing e controle de marketing. Para o componente “estratégia de marketing”, Kotler (1999, p. 213) propõe seis pontos a serem observados pelo gerente: mercado-alvo, posicionamento central, posicionamento de preço, proposta total de valor, estratégia de distribuição e estratégia de comunicação.
O pensamento estratégico de Kotler parece se apropriar de conceitos das três escolas prescritivas. Primeiramente, a visão de que cabe ao gerente desenhar a estratégia que deve ser seguida pelos demais é típica da escola de design. A própria ferramenta de análise SWOT é uma assinatura inconteste.
Por outro lado, o sistema de planos proposto (ao menos 12) é característico da filosofia da escola de planejamento. Nesse ponto, o processo de formação de estratégia não parece ser tão simples como o defendido pela escola de design, mas formal e complexo como na escola de planejamento.
Por fim, Kotler propõe estratégias genéricas, como posicionamento, nicho de mercado geográfico e aumento de participação no mercado, ideias fortemente difundidas pelos autores da escola de posicionamento.
Luciene Ricciotti Vasconcelos, em Planejamento de Comunicação Integrada, entende o problema de comunicação como elemento central do processo de planejamento:
Planejar a comunicação é muito mais do que escolher o que vai ser dito em uma
campanha e fazer propaganda em jornais e revistas. É analisar e diagnosticar
corretamente um problema específico e encontrar uma solução estratégica,
potencializando o mercado em estudo por meio das mais variadas ferramentas do
composto de comunicação: propaganda, promoção de vendas, relações públicas,
marketing direto e força de vendas. (VASCONCELOS, 2009, p.16).
Para a autora, o planejamento de comunicação envolve obrigatoriamente, além da análise de um problema específico, o diagnóstico da situação atual, a escolha da estratégia de comunicação e a definição do foco da mensagem.
O planejamento é em essência uma atividade criativa, na visão de Vasconcelos. A autora defende que é importante ter informações recentes e consistentes sobre a situação, “sem preconceber ideias ou manter-se atrelado a ideias antigas e, somente depois, trabalhar em uma solução” (VASCONCELOS, 2009, p.27).
Para Maurício Tavares (2011, p.41), o planejamento deve ser elaborado em três níveis. O planejamento estratégico estaria no plano global da organização e com perspectiva de longo prazo, o planejamento tático é “de média duração que abrange uma unidade (departamento) da organização” e o planejamento operacional é de curta duração e tem como objetivo controlar rotinas de alguma unidade da organização.
Os dois últimos autores também se aproximam do pensamento estratégico das escolas prescritivas. De maneira geral, quando se fala em planejamento de comunicação, os autores propõem um processo formal, com etapas bem definidas e instrumentos estabelecidos para cada tarefa. Não foram observadas reflexões substanciais a respeito do processo do planejamento, do papel do planejador. Também não há análises críticas a respeito do custo e do benefício de se criar um ou muitos planos no contexto da organização.
Essas reflexões nos parecem oportunas porque o processo de planejamento, quando encarado de maneira simplista, pode gerar prejuízos. Em uma crítica à escola do design e em especial ao executivo criador de estratégias, Mintzberg (2000, p. 36) lembra que “sentar-se e planejar estratégias no escritório, ao invés de lidar com produtos e clientes reais pode ser um negócio perigoso!”.
Uma estratégia, quando definida de forma rígida em um plano, pode cegar a organização, especialmente se for feita por pessoas que não lidam com a rotina e com a execução da estratégia. O distanciamento entre quem planeja e quem executa faz parte da receita das escolas prescritivas de pensamento estratégico.
O uso de ferramentas como a análise SWOT também pode ser facilmente questionado. Como é feita a definição de pontos fortes e fracos? Existem evidências concretas, indicadores de pesquisas ou análises cuidadosas? De que vale um grupo de gestores sentar em uma tarde para preencher de forma superficial um quadro com meia dúzia de aspectos positivos e negativos da organização? Mintzberg (2010, p. 35) acredita que “nenhuma organização poderá saber com certeza, antecipadamente, se uma competência estabelecida irá se mostrar um ponto forte ou um ponto fraco”.
A própria aposta na capacidade de previsão de futuro, muito presente nas metodologias da escola de planejamento, é questionável. Até que ponto é possível e confiável prever o futuro? Os complexos sistemas de planos são montados a partir de indicadores de tendências e análises de cenários. Por mais precisos e atuais que sejam esses dados, pode-se imaginar que o plano seria efetivo de fato se nada mudasse no ambiente externo durante o período de execução da estratégia. Algumas frases célebres fazem previsões imprecisas parecerem desatinos anos mais tarde. O que dizer da afirmação “creio que exista um mercado mundial para cerca de cinco computadores”, de Thomas Watson, presidente da IBM, em 1948? ou “a energia atômica é tão boa quanto nossos atuais explosivos, mas é improvável que ela produza qualquer coisa mais perigosa.” (Winston Churchill, 1939)15.
O perigo parece estar não em utilizar ferramentas como construção de cenários futuros ou análises SWOT, mas em tê-los como absolutos, engessar a atuação e obstruir um processo natural de observação, aprendizado ou aproveitamento de oportunidades. Afinal, “uma única história de um cliente insatisfeito pode valer mais que todas aquelas resmas de dados de pesquisas de mercado porque, embora estas possam identificar um problema, é o primeiro que pode sugerir uma solução”. (MINTZBERG, 2000, p. 61).
Rigby (1993, p. 15 apud MINTZBERG 2000, p.65) diz que o “segredo está em aprender quais instrumentos usar, como e quando”. Para isso, “os instrumentos devem ser julgados por sua utilidade, não por serem novidade. Os instrumentos existem para o benefício das pessoas, e não vice-versa”.
As críticas ao pensamento prescritivo, no entanto, não costumam vir acompanhadas de soluções objetivas ou de propostas práticas efetivas para resolver os problemas. As abordagens de aprendizado, por exemplo, uma clara resposta ao paradigma dominante dos processos formais de planejamento, apresentam uma série de riscos. Uma organização sem alinhamento pode resultar em uma série de tecnologias ou produtos que, desconexos, não proporcionam estabilidade ou rentabilidade. Outros dois riscos é o de abandono de uma estratégia promissora no afã de experimentar uma estratégia nova ou de apostar em uma estratégia errada que tenha emergido de algum indivíduo ou grupo e que possa levar a organização a uma posição indesejável. Também não ajuda muito a ideia de que uma organização dependa de um líder visionário, como na escola empreendedora. Toda organização gostaria de um empreendedor com talento, visão e faro aguçado. Mas saber disso não contribui para a identificação de algum padrão que possa ser repetido ou buscado pelas organizações.
Até mesmo os críticos das escolas prescritivas concordam que as pessoas funcionam melhor quando podem conceber algumas coisas como certas por algum tempo. A estratégia resolve as grandes questões para que as pessoas possam se dedicar ao operacional, cuidar dos pequenos detalhes. Esse consenso é fundamental para acreditar no processo de planejamento (adequado) 15 Frases reproduzidas por Mintzberg (2000, p.58) como um esforço válido, ainda que ele possa ser feito de diferentes maneiras. Margarida Kunsch resume esse debate de uma forma interessante, sem adotar um discurso com rígidas prescrições, mas ao mesmo tempo sem fugir do pragmatismo necessário a quem precisa se organizar para solucionar os problemas no mundo real. Planejamento é para a autora “um processo racional-lógico, que pressupõe estudos, questionamentos, diagnósticos, tomadas de decisões, estabelecimento de objetivos, estratégias, alocação de recursos, curso de ações etc.” (KUNSCH, 2002, p. 203).